Caprinocultura em Betânia do Piauí é referência

A Criação de ovelhas e cabras no município de Betânia do Piauí (521 km de Teresina) e sua lucrativa comercialização da carne e pele na capital piauiense, com faturamento de R$ 3 milhões nos últimos dois anos, transformou-se em uma referência mundial para a caprinocultura.

A pesquisa “Sertão do Piauí: um estudo centrado no Território da Chapada do Vale do Itaim (região de Paulistana)”, de Pablo Sidersky, aponta que o êxito da experiência da caprinocultura em Betânia do Piauí está relacionado com a iniciativa comercial da Ascobetânia (Associação dos Caprinocultores de Betânia do Piauí), que resolveu eliminar o intermediário e comercializar seus produtos em Teresina com preços mais justos.

Segundo o pesquisador, em função do crescimento da produção e da organização, o Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa (Sebrae) passou a buscar uma forma de conectar a Ascobetânia com o mercado de Teresina.

O início de 2015, o Sebrae levou para Betânia um representante do único estabelecimento frigorífico com o SIE (Selo de Inspeção Sanitária estadual) do Piauí. De acordo com a pesquisa de Pablo Sidersky, o acerto foi que a Ascobetânia agenciaria o transporte e entrega de animais (ovinos), para abate nas instalações do frigorífico em Teresina.

Segundo Sidersky, caberia à associação e aos seus sócios escolher e transportar os animais até as dependências do frigorífico. O primeiro envio foi de 100 animais, feito em março de 2015. Em seguida, a entrega passou a ser de 120 animais por semana, podendo chegar a 150 animais em momentos especiais (como, por exemplo, nas festas do final do ano).

“Os nossos entrevistados afirmaram que não houve exigência inicial, por parte dos compradores, quanto à idade nem o peso dos animais. Inicialmente, foram enviados animais mais velhos. Com o tempo, isto foi se modificando. Hoje, os animais enviados a Teresina têm, na sua enorme maioria, entre 6 e 10 meses de idade”, adiantou o pesquisador.

No ritmo atual, de 120 animais por semana, são vendidas 500 cabeças por mês. Num ano, esta cifra passa das 6.000 cabeças. Em tese, a Ascobetânia entra nesta operação somente como uma prestadora de serviços, realizando o transporte dos animais e intervindo também na organização de toda a operação. No entanto, na busca de uma simplificação da transação, foi acordado que, pelo menos durante um período, o comprador vai repassar o dinheiro envolvido na operação para a Ascobetânia que, ato seguido, o distribui entre os criadores que enviaram animais para Teresina.

Via este canal da Ascobetânia, um criador recebe um valor de R$ 3.360 pela venda dos seus 15 animais (por ano). Com o preço pago nas feiras da região, o mesmo criador receberia, em agosto de 2016, o valor de R$ 2.400 pelos 15 animais. Assim, este criador recebe 40% a mais, graças a esta operação de venda em Teresina.

“É claro que o diferencial dos preços que havia em agosto não se mantém o ano inteiro. De fato, no mês de outubro a diferença tinha caído para aproximadamente 17%. É possível imaginar um momento em que os ganhos se equiparam. Entretanto, é importante lembrar que o fato do ganho ser menor em algum momento do ano, não elimina os ganhos acumulados durante os períodos nos quais os preços da feira ficam deprimidos”, acrescenta o pesquisador.

A iniciativa que aqui está sendo comentada tem permitido uma movimentação econômica muito expressiva. Dados os preços fixos e as quantidades bastante estáveis, fica fácil fazer uma estimativa da receita global que a iniciativa Ascobetânia – frigoríficos propiciou para os criadores. Como a receita semanal é de R$ 28.800, por ano chega-se ao valor de R$ 1.497.600. Estima-se que, ao atingir os dois anos de funcionamento (em março 2017), esta iniciativa tenha movimentado aproximadamente R$ 3 milhões.

Território da Chapada do Vale do Itaim possui 16 municípios

A pesquisa de Pablo Sidersky mostra que o Território da Chapada do Vale do Itaim, criado no ano 2015, é composto por 16 municípios: Acauã, Belém do Piauí, Betânia do Piauí, Caldeirão Grande do Piauí, Caridade do Piauí, Curral Novo, Francisco Macedo, Jacobina do Piauí, Jaicós, Marcolândia, Massapê do Piauí, Padre Marcos, Patos do Piauí, Paulistana, Queimada Nova e Simões.

“Esse território apresentava uma marcada ‘ruralidade’, com 62% vivendo na zona rural. Uma parte importante desta população (28%) encontra-se em situação de extrema pobreza. O Território está inserido na região semiárida piauiense. O fator pluviometria é, como em toda a região semiárida, o elemento chave naquilo que se refere ao clima. As chuvas são escassas e irregulares, sendo bastante comum a ocorrência de secas. A estação chuvosa dura aproximadamente cinco meses, sendo que as médias pluviométricas anuais variam de 450 a 662 mm. A atividade econômica de maior relevância do Território é a agropecuária. Também tem certo peso o setor de comércio e serviços em geral”, aponta o estudo.

Desafio

A sazonalidade ou, mais amplamente, a irregularidade na oferta é frequentemente lembrada como um problema crônico desta cadeia produtiva. Há uma relação direta entre a variação do preço no mercado, o ciclo climático anual e suas variações (anos de seca ou não), e os sistemas de criação. A relação entre disponibilidade de alimento (forragem) e o tamanho do rebanho tem uma grande influência na decisão do criador de vender ou reter animais. No entanto, mesmo que possam ser modificadas algumas das condições que provocam esta situação, avalia-se ser difícil eliminar completamente as flutuações da oferta de animais no mercado, em especial nos anos de seca mais severa. Mas um incremento substancial na produção e no armazenamento de forragem poderá ter uma incidência positiva nesta questão, reduzindo esta irregularidade e, mais amplamente, aumentando o volume total da oferta.

A disponibilidade de água é absolutamente crucial para os sistemas de criação animal. Por isso, ampliar o acesso à água (com a instalação de poços, cisternas de produção, barreiros, barragens subterrâneas deve ser uma prioridade, tanto para os próprios criadores, como para outros atores sociais que atuam no Território.

“Será necessário agir para enfrentar outros problemas de manejo dos rebanhos no Território. No âmbito do manejo sanitário será necessário ampliar e aperfeiçoar a vacinação e a vermifugação. Também será muito importante estimular um maior cuidado com as crias nos primeiros meses de vida, principalmente por meio de uma melhor alimentação das mães. Embora muitas vezes os ‘pequenos criadores’ (aqueles que têm pouca terra e um rebanho pequeno) sejam esquecidos, o estudo conclui que muitas destas famílias têm o maior interesse em aprimorar os seus sistemas produtivos, havendo nestes estabelecimentos um ‘espaço de progresso’ em termos de crescimento da produção. Isto significa que é necessário estimular o investimento nestas unidades, na busca de uma intensificação da produção. O apoio à organização local ou municipal destes produtores deverá ter um papel importante neste âmbito”, afirma o pesquisador. (E.R.)

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