Opinião: desdém com o dinheiro público

Na semana passada, diversas notícias deram conta de mais problemas estruturais em apartamentos do programa Minha Casa, Minha Vida, em vários estados, mas com especial ênfase no Rio Grande Sul, Santa Catarina e Rio de Janeiro.

O problema não é novo, mas as denúncias aumentaram no ano passado. Vejamos, como exemplo, alguma notícias veiculadas em 2015:

“Problemas no programa Minha Casa, Minha Vida representam hoje um dos mais importantes focos de investigação do Ministério Público Federal. No Rio Grande do Sul, o disque-cidadão do MPF contabilizou nos últimos anos mais de mil irregularidades a serem checadas. A imensa maioria, problemas de acabamento nos imóveis ou inadimplência e falência de empreiteiras. Em alguns casos, revenda ou aluguel dos apartamentos, vetados pela lei quando não estão quitados (na faixa de menor renda dos mutuários).”

 “…Um pesadelo de infiltrações, rachaduras, remendos e consertos sem fim? Pois isso é comum no Minha Casa, Minha Vida. A maioria dos casos referentes ao programa governamental que chegam aos tribunais é a respeito de ‘vícios construtivos’ – falhas na construção da residência. É o que ocorre na 24ª Vara Federal de Porto Alegre, especializada em casos relacionados ao Sistema Financeiro da Habitação ocorridos em todo o Rio Grande do Sul. Dos cerca de 3,8 mil processos que tramitam ali, o que mais cresce em volume de casos envolve programas de habitação popular da Caixa Econômica Federal, como o Minha Casa Minha Vida.”

 “Inaugurado há dois anos, um conjunto habitacional do programa Minha Casa, Minha Vida, no Rio de Janeiro, está dando muita dor de cabeça para os moradores. Novecentas famílias reclamam das péssimas condições dos apartamentos e da área do condomínio.
O condomínio é a realização do sonho da casa própria para 320 famílias inscritas no programa em Campo Grande. Ao invés de comemorar, todos estão revoltados.

A pia da cozinha da técnica de enfermagem Natália Alves está lotada de louça porque não sai nenhuma gota de água da torneira. A companhia de abastecimento faz manutenção no local e o reservatório do condomínio está inoperante desde maio, quando rompeu. Duas caixas de água foram instaladas, mas, de acordo com os moradores, nunca foram ligadas.”

 Bem, senhores, como disse, estas são notícia veiculadas ao longo de 2015. E tais fatos, mais aquela dezenas de outros que acontecem em todo o Brasil neste setor, só fazem confirmar o absoluto desdém das ditas autoridades de governo em relação ao dinheiro público. Aliás, elas só levam a sério o erário quando se trata de encher seus próprios bolsos.

É inadmissível que construções financiadas pela Caixa Econômica Federal, órgão que de há muitíssimo tempo tem vasta experiência em habitação, apresentem tais falhas, oriundas, obviamente, da má construção por parte de empreiteiras que cobram caríssimo e querem gastar cada vez menos para construir, principalmente quando se trata de “casa pra pobres”.

Houvesse um mínimo de seriedade no chamado “trato com a coisa pública” e logo nas primeiras denúncias deveria ter ocorrido uma verdadeira devassa nos projetos, uma investigação séria, colocando para correr empreiteiras fajutas, que constroem arapucas, mas ganham bilhões com elas.

No entanto, diante da escandalosa permissividade que se verifica, é de se suspeitar até que pode estar havendo conivência de setores do governo, inclusive da CEF, em troca sabe-se lá de que (hum!) com a baderna que domina as construções do referido programa.

Mas assim caminham, de um modo geral, as obras públicas neste País. Mais um exemplo? Preste atenção na fragilidade das estradas e pontes em regiões atingidas por cheia provocadas por chuvas previsíveis desde séculos. Em qualquer lugar do mundo, é verdade (excetuando-se, talvez, Tóquio, Copenhague e Oslo, para citar algumas cidades do mundo verdadeiramente civilizado), tormentas repentinas causam inundações e podem, sim, derrubar algumas construções.

No entanto, no Brasil, estradas e pontes derretem-se como geleia. E para começar a entender a razão dessa fragilidade absurda, basta prestar atenção nas imagens fartamente mostradas atualmente na TV e internet e notar a finíssima camada asfáltica, sem  QUALQUER  base, que constitui as estradas brasileiras.

Não será preciso dizer mais nada. Mas somos um País onde fazer obra pública significa exatamente construir mal para logo sejam necessárias mais obras e se ganhe mais e mais dinheiro dos cofres públicos. Um escândalo. Mas aposto que nada vai mudar…

Por Alex Ferraz, jornalista.