Crônica: A máquina de escrever

As pessoas não me usam como antigamente. Sinto-me sozinha. Fui trocada por computadores. Eu sei, eles são ágeis, com teclas rápidas e precisas e em um simples clique todas as palavras somem sem deixar vestígios.

Eu sou complicada, preciso de atenção, paciência e… Tudo bem, eu confesso que estou parecendo um ser humano. E para piorar, estou parecendo um ser humano carente. Era para ser uma propaganda, mas não andei pescando para vender o meu peixe. Eu sei que você está se perguntando “como esta máquina ousa desejar que seja levada para cima e para baixo?”. Caro leitor, fui criada em 1714. Não havia receita da sopa verde naquela época.  Sou pesadinha, mas se você me utilizar para escrever uma carta de amor ganhará pontos com a patroa. Eu falei “patroa”? É a convivência com a tecnologia.

Eu era tão valorizada em na década de 1960 e 1970. Vocês deveriam ver o quanto eu era amada. Poucos percebem, mas fui amiga de muitos escritores conhecidos e famosos. Indiretamente, participei da sua formação. Estou sendo prepotente, mas é verdade. Jorge Amado não me largava, Érico Veríssimo realmente me tinha na palma da mão (quase ao considerar meu tamanho) e Clarisse Lispector escrevia belos textos com a minha ajuda. Porque metade de mim ajudava escritores a escrever belíssimas obras e a outra também.

Não me joga fora, estou cara por ser raridade. Ainda embelezo escritórios e quartos, mas quando você me observar estarei te convidando para me desvendar. Com o tempo ganharei a sua confiança e por um momento sentirá que está em uma década diferente. Pode me guardar onde você esconde aquilo que ficou velho, mas eu nunca te negarei palavras marcadas em um papel.

Eu te concedo palavras, uma constelação de palavras.

Calincka Crateús – Graduanda em Jornalismo

Escritora do blog Toda Linda de Valentino