Para historiador, independência criou nação fundada na escravidão

A Independência do Brasil em relação a Portugal criou uma nação “fundada na escravidão”, analisa o historiador Rafael Domingos Oliveira, que faz parte do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Afro-América. Em 1822, o então príncipe regente do Brasil, Dom Pedro I, declarou a quebra da relação colonial com a metrópole europeia e emancipou o país. A escravidão legal só séria extinta décadas depois, em 1888.

Romper com a dominação direta de Portugal exigiu, segundo o historiador, costurar acordos com os proprietários de terras que tinham a produção movida pela mão de obra escravizada. Foi essa articulação que permitiu também que o país não se fragmentasse, como aconteceu com as colônias de dominação espanhola.

“Há linhas interpretativas muito consistentes que afirmam, por exemplo, que a independência foi construída sob um pacto de manutenção da escravidão. A integridade do território dependia, em boa parte, da defesa irrestrita dos interesses da classe senhorial. Nesse sentido, a independência em relação à Coroa Portuguesa significou para a população negra escravizada mais escravidão. A nação surgiria, assim, fundada na escravidão.”, explica Oliveira, como a construção do Brasil como país independente está fortemente ligada ao modelo de produção baseada na exploração da população escravizada.

Logo após o fim da escravidão institucionalizada, o Império acabou deixando de existir, com a Proclamação da República em 1889. Porém, o fim da monarquia não se refletiu, necessariamente, em melhorias nas condições de vida das pessoas negras. “Outros pactos das classes senhoriais e da elite se seguiriam ao longo da nossa história. Em todos eles, a população negra foi mantida na exclusão, na escassez e no genocídio”, acrescenta Oliveira.

Apesar dessas considerações, o historiador também acha importante lembrar que a declaração de independência aconteceu em um contexto de diversas revoltas populares contra a opressão que a colonização exacerbava. “É necessário olhar com cuidado para essa perspectiva, afinal existiram muitas revoltas e tensões sociais antes, durante e após o 7 de setembro que evidenciam a importância da participação popular e dos projetos que se esboçavam no período, mesmo que todos tenham sido suplantados”, pondera.

Indígenas continuam sem terras
O historiador indígena e professor da Universidade Estadual de Santa Cruz, Casé Angatu (foto de destaque acima), lembra que a emancipação do Brasil como nação também não trouxe benefícios aos povos originários, que desde 1500 tiveram os territórios invadidos pelos europeus. “Que independência foi essa? Ela foi feita por um herdeiro da corte portuguesa que não mudou o quadro existente de racismo, de genocídio e etnocídio sobre os povos indígenas e a população negra”, enfatiza.

Do mesmo modo, o professor destaca que foi mantida a desigualdade social, com a concentração de terras nas mãos de poucos proprietários. “Não alterou a situação latifundiária do Brasil. Não houve uma reforma agrária, que em outros países ocorreu”, diz sobre a uma situação que foi mantida mesmo após o fim do Império.

Estado Plurinacional
Até hoje, os povos originários ainda lutam, segundo Angatu, para terem os direitos reconhecidos no país. “A nossa verdadeira independência está para ser feita. Quando a gente fala de independência a gente fala de Estado nacional. O Estado brasileiro tem quer perceber que esse país é formado por povos. Assim como alguns estados na América-Latina já trabalham com a ideia de Estado multiétnico. Era isso que o Brasil tinha que perceber, que aqui são vários povos, que é multiétnico, plurinacional, na verdade”, diz.

Em 2009, a Bolívia fez uma reforma constitucional em que se tornou um Estado Plurinacional, como forma de reconhecer a diversidade étnica e cultural do país.

Agência Brasil

Historiadora desenvolve roteiros sobre memória da ditadura militar

Para além dos livros e arquivos, é difícil encontrar referências explícitas no Rio de Janeiro ao período da ditadura militar. Não há centros de visitação, tampouco museus sobre o tema. Com isso em mente, a historiadora Samantha Quadrat, professora da Universidade Federal Fluminense (UFF), mapeou lugares da cidade que guardam as memórias do regime autoritário entre 1964 e 1985.

Desde o ano passado, ela coordena visitas guiadas com estudantes da educação básica, universitários e professores. A atividade é parte do projeto “Lugares de Memórias”, apoiado pela bolsa de produtividade do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq.

“Roteiros como esses permitem que você fomente questionamentos, empatia pelas vítimas, valores democráticos, e que discuta também a relação da cidade com as forças de segurança. É uma possibilidade de pensar o ensino na ditadura militar”, explica a historiadora. “A gente não tem no Rio um museu como o de São Paulo, o Memorial da Resistência. Então, é importante que a gente ocupe a cidade, se aproprie cada vez mais dela, dessa história e dessas memórias”, argumenta.

O primeiro roteiro que a pesquisadora desenvolveu foi sobre o movimento estudantil secundarista. A ideia é tornar mais conhecida a atuação desse grupo durante o regime militar, por entender que as histórias sobre a resistência universitária costumam receber mais atenção. Samantha mapeou pontos emblemáticos da cidade que lembrem principalmente a vida e o assassinato do estudante Edson Luís, símbolo da luta dos secundaristas.

Restaurante Calabouço
Um dos destaques é o prédio do Ministério Público, na região central do Rio. No espaço onde hoje existe um estacionamento, funcionava na década de 60 o restaurante Calabouço. Ele havia sido instalado originalmente em um ponto do bairro do Flamengo e fornecia refeições com preços mais baixos para estudantes da rede pública.

O prédio foi demolido e um novo estabelecimento aberto no centro. Mas a obra estava inacabada e o restaurante passou a selecionar quais usuários podiam entrar. No dia 28 de março de 1968, um grupo de estudantes secundaristas ocupou o lugar e protestou contra as novas condições. Dezenas de policiais militares interromperam a manifestação e atiraram nos estudantes. Edson Luís Lima Souto, de 18 anos, foi atingido no peito.

A história continua na Santa Casa de Misericórdia, também incluída na visita guiada. Depois de baleado, Edson Luís foi conduzido para lá, onde foi confirmada a morte. Os colegas secundaristas impediram que o corpo fosse levado ao Instituto Médico Legal (IML), com medo de que os policiais sumissem com ele. O destino escolhido foi a então sede da Assembleia Legislativa do Estado da Guanabara, atual Câmara Municipal. É no local que termina o roteiro com a historiadora.

“Ali, diante dos olhos vigilantes dos estudantes que temiam o que a ditadura poderia fazer com o corpo do secundarista, foram feitas a autópsia e o velório. Aos poucos, milhares de pessoas foram chegando para prestar homenagem e protestar contra a ditadura. Infelizmente, esse episódio não é lembrado na visitação guiada que é realizada no local”, afirma a historiadora.

Edson Luís homenageado
A única lembrança concreta que existe do episódio no Rio é o monumento criado em 2008 para homenagear Edson Luís. Foi uma oferta à cidade da então Secretaria Especial dos Direitos Humanos, do governo federal. Ele fica na praça Ana Amélia, perto da Santa Casa de Misericórdia.

A escultura traz uma bandeira rasgada em meio a uma mancha vermelha e pegadas de vidro na base. Mas quem chega ali hoje não encontra placa, nem qualquer outra referência explicativa. A reportagem da Agência Brasil chegou a ser abordada por um morador da região que desconhecia o significado do monumento.

A pesquisadora prepara outros roteiros sobre a ditadura, que vão trazer recortes temáticos como o golpe de 64 e a história do Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna – DOI-CODI, o órgão de inteligência e repressão subordinado ao Exército brasileiro. Ela reforça que ações como essa são importantes para resistir aos silêncios, intencionais ou não, do período autoritário que o país viveu. Mas que é fundamental que o Rio de Janeiro e outras cidades invistam na preservação dessa história.

“A ditadura e os governos democráticos, durante os debates da modernização, acabaram destruindo alguns desses lugares de memória. É urgente que a gente tenha centros de memória. Um deles deveria ser no prédio do Departamento de Ordem Política e Social – DOPS – que está caindo aos pedaços e que chegou a ser o museu da polícia. É fundamental que a gente crie a demanda pelos memoriais, que haja reflexão na cidade, que consiga fazer um museu como o Chile fez, de memória e direitos humanos”, afirma Samantha.

O destino do prédio onde funcionou o DOPS, no centro da cidade, está em disputa há anos. Recentemente, a deputada estadual Dani Balbi (PSOL) apresentou projeto na Assembleia Legislativa do Estado (Alerj) para que seja criado no prédio o Museu da Memória e da Verdade do Estado.

Serviço

Colégios, professores, estudantes e outros interessados em participar das visitas guiadas do projeto “Lugares de Memória” podem escrever para o e-mail da historiadora ([email protected]) ou entrar em contato pela conta do Instagram (@lugaresdememoria).

Agência Brasil

Balança comercial tem melhor saldo da história para meses de maio

Beneficiada pelo início da safra e pela alta das commodities (bens primários com cotação internacional), a balança comercial registrou o melhor saldo da história para meses de maio, desde o início da série histórica, em 1989. No mês passado, o país exportou US$ 9,291 bilhões a mais do que importou.

O saldo é 35,9% maior que em maio de 2020. No último mês, as exportações somaram US$ 26,948 bilhões, alta de 46,5% sobre maio de 2020 pelo critério da média diária. As exportações bateram recorde histórico para todos os meses desde o início da série histórica, em 1989. As importações totalizaram US$ 17,657 bilhões, alta de 57,4% na mesma comparação.

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Comunistas preparam exibições de filmes com histórias políticas em Juazeiro (BA)

Cine Comuna

Na próxima quinta-feira (10) terá início as atividades do Cine Comuna, evento promovido pelo diretório municipal do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). O projeto prevê a exibição, mensalmente, de filmes que estão fora do eixo comercial provocando, a cada encontro, discussões políticas.

O filme ‘Araguaya: A Conspiração do Silencio’  será apresentado na primeira sessão . A película narra um dos episódios mais importantes da história do Brasil contemporâneo, que se passa durante os piores anos da ditadura militar que o país sofreu, a Guerra do Araguaia. Nesse período, grupos de guerrilha se articulavam na região para levar as forças de resistência a uma briga armada para libertar o país dos militares.

As sessões são gratuitas, com muita pipoca e livros a venda. O Cine Comuna será realizado na sede do partido (Rua Visconde do Rio Branco, nº 68, Bairro Angari) e é aberto a todos.

MEC suspende vestibular para curso de licenciatura em História da UFPE em Olinda, Pesqueira e Petrolina

Seis cursos superiores de Pernambuco tiveram o vestibular suspenso pelo Ministério da Educação (MEC) depois de serem considerados insatisfatórios de acordo com o Conceito Preliminar de Curso (CPC) – indicador de qualidade do Ensino Superior no Brasil. A licenciatura em História da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) está na lista, que também conta com graduações em Olinda, Pesqueira e Petrolina.

A decisão foi publicada ontem (23) no Diário Oficial da União, que determina que sejam aplicadas “medidas cautelares preventivas de de suspensão de ingresso” em tais cursos, justificado por “reiterados resultados no CPC nos anos de 2011 e 2014”.

Além do curso da UFPE, estão na lista as licenciaturas em Letras (Espanhol) e Pedagogia do Instituto Superior de Educação de Pesqueira, a licenciatura em Letras da Faculdade de Ciências Humanas de Olinda e a graduação em Física pelo  Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão, de Petrolina.

Ao todo, 68 cursos foram proibidos de receber novos alunos pelo MEC, em todo o país. O CPC é calculado a partir de uma avaliação completa, que considera desde o desempenho dos alunos, infraestrutura, corpo docente e recursos pedagógicos, além de outros aspectos. A avaliação é realizada a cada três anos e a análise publicada nesta quarta é referente aos dados coletados em 2014.

Os estudantes que já estejam matriculados em algum desses cursos não serão afetados. (Fonte: Diário de Pernambuco)

Petrolina antiga, ameaçada pela especulação imobiliária por não ser tombada

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A história de uma cidade não é contada apenas em livros ou na memória oral de seus habitantes. Também está contida na arquitetura e em monumentos espalhados na área urbana e rural. Um dos mais importantes município do Sertão de Pernambuco, Petrolina, famosa por seu artesanato e sua fruticultura que impulsiona a economia regional, completou 120 anos de emancipação política em setembro. Seus ícones arquitetônicos estão espalhados na área central, desenhando o sítio histórico da cidade sertaneja.

Só que nos últimos vinte anos, grande parte desse cartão postal histórico, considerado patrimônio da comunidade, vem sendo degradado e ameaçado ao desaparecimento, apesar de leis que protegem o patrimônio público.

A Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe), responsável pelos tombamentos dos bens culturais do Estado de Pernambuco, já tombou vários prédios a exemplo da Igreja Matriz e seu entorno, a Praça do Centenário e a Estação Ferroviária da Estrada Leste Brasileiro.

Por outro lado, parte da chamada Petrolina antiga, está ameaçada pela especulação imobiliária por não ser tombada. Com características do século 19, algumas edificações que representa esse casario funcionaram por mais de meio século, como armazéns comerciais até o começo dos anos 80. Hoje estão desativados e sem projeto de manutenção ou restauro.

De acordo com a arquiteta Camila Alencar, o patrimônio conta parte da história da localidade e corresponde à herança da memória coletiva e identidade cultural da comunidade. “Muitas dessas construções mostram a diversidade no percurso do tempo e registram os diferentes momentos históricos, marcando cada época com o seu padrão estético e construtivo próprio. É necessário proteger esse patrimônio, para que possa continuar sendo objeto de estudo para as futuras gerações”, argumenta.

A educadora Déa Raquel, residente em um solar próximo da Praça 21 de Setembro, em frente ao coreto e ao histórico Clube da 21, que ainda estão preservados.  Seu avô participou de construções importantes de Petrolina.  “É prazeroso viver em um lugar que tem tantas histórias e recordações a partir da arquitetura. Isso é grandioso pra nossa cultura. Mas é preciso defender que os exemplares que ainda existem não sejam demolidos”, argumenta.

Em setembro deste ano, a diretoria do Patrimônio Histórico e Cultural do Exército, junto com a Prefeitura, anunciaram apenas o projeto de revitalização da Praça Kennedy que abriga o monumento dos Pracinhas, inaugurado há dois anos, em homenagem à Força Expedicionária Brasileira (FEB). O espaço foi construído com o objetivo de reverenciar os soldados da região que deixaram a sua terra natal para defender a Pátria durante a 2ª Guerra Mundial, há 70 anos. ( Por Jorge Alencar, Multi Ciência – Uneb)

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