Pescador investe quase R$ 10 mil para reformar barco na Bahia e entregar presente à Iemanjá: ‘quis manter essa tradição’


Gratidão, amor, devoção e tradição serviram como combustível para o pescador Fernando Lopes, de 44 anos, investir quase R$ 10 mil na reforma da embarcação que navegará com o presente principal à Rainha do Mar, Iemanjá, neste 2 de fevereiro, em Salvador.

Nesta quarta-feira (2), o cenário na praia o Rio Vermelho não deve ser de multidões, devotos com pés na areia, flores e alfazemas nas mãos, porque aglomerações não serão permitidas no bairro devido à pandemia da Covid-19. A festa foi cancelada pelo segundo ano consecutivo e o prefeito Bruno Reis já antecipou que a praia do Rio Vermelho estará fechada.

Apesar do cancelamento, o ponto alto das homenagens à Iemanjá, a entrega do presente coletivo, está mantida e prevista para 8h. Na ocasião, os pescadores se afastam da costa e levam a oferenda de barco.

Há três anos, Fernando Lopes, que também é professor, fez questão de comprar a embarcação que há quatro décadas é usada para levar o presente principal e coletivo para Iemanjá. O Rio Vermelho, como foi nomeado o barco, precisou de reforma, pois segundo Fernando, é preciso manter essa herança cultural nas homenagens à orixá.

Os R$ 9,7 mil investidos e os 20 dias de espera resultaram em um barco pintado, com tábua do fundo trocada e até uma peça do motor, que havia quebrado, foi substituída. “Meu sentimento é de gratidão de estar contribuindo com essa tradição, com essa festa que é tão emblemática e grandiosa”.

Neste ano, ele pretende agradecer à Rainha do Mar pela vacina contra a Covid-19. “Nada mais justo do que agradecer o que pedimos ano passado”, afirma. Apesar de lamentar falta do calor humano e da multidão que tomava conta das ruas do Rio Vermelho antes da pandemia, o pescador garante que nos dois últimos anos, a entrega tem sido mais tranquila.

G1 BA

A experiência de participar da festa de Iemanjá: salve Odoyá, salve a rainha do mar!

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Foto: Pedro Carvalho Diniz

Muito se especula das religiões africanas, mas poucos, de fato procuram saber. As críticas, a falta de respeito e de conhecimento, dominam o senso comum que julgam sem ao menos se permitir conhecer. Eu, até pouco tempo nada sabia sobre o universo das religiões de matriz africana. E admito, ainda pouco sei, porém respeito, infinitamente.

Dois de fevereiro, é a data em que se comemora o dia de Iemanjá, a rainha do mar, a mãe de todos os orixás, a protetora das crianças e das famílias. No sincretismo religioso ela é representada na figura de Maria, mãe de Jesus Cristo. Essa jornalista que vos escreve, sempre foi curiosa como o quê, quando o assunto é o desconhecido. Principalmente levando em consideração que nasceu e cresceu na doutrina do catolicismo tradicional, onde assim como demais vertentes do cristianismo, trata as outras religiões como sendo “o lado negro da força”. A convite de amigos, fui conhecer o Ilê Axé Ogum de Ronda, aqui em Petrolina, sertão de Pernambuco. Lá, fui apresentada a Ialorixá Socorro, a quem todos chamam de Mãe Socorro, a “Mãe-Pequena” Edinha e ao Pai Edson.

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Foto: Pedro Carvalho Diniz

Não posso deixar de destacar o quão lindo e diferente é o rito.  Flores enfeitam o local, aos poucos os filhos de santo da casa, a mãe Socorro, o pai Edson, os pais e mães de santo da região e os convidados, se reúnem. Com exceção dos convidados, todos começam a dançar ao som do atabaque e entoam cantigas que falam do demais orixás.  O canto alegre contagia o local. Em determinado momento, a “Mãe Edinha” entra, mas não é ela, é a mãe Iemanjá que já está presente. Ela dança com graça, a mãe de todos os orixás, também é guerreira e no seu “baile” faz referência a um combate com espada empunhada.

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Foto: Pedro Carvalho Diniz

Todos dançam e cantam, ela está ali, ela é a presença principal da festa. Depois de um certo tempo, a Orixá senta para dar a benção a seus filhos e se despedir. Primeiro os filhos da casa, depois os visitantes. Um a um, deitam sob seus pés e de joelhos a abraçam. Em seguida, ela entra em um quarto e quando retorna, é novamente a Mãe Edinha.

Após o término do momento festivo, um jantar foi servido. Assim como fui ensinada em casa, primeiro os convidados, depois os de casa. É um mundo curioso, enfim, mas não muito diferente daquele fui criada. São pessoas comuns que se divertem e agradecem. Não há bicho-papão, não bebi sangue de animal, nem vi criancinhas sendo sacrificadas. Para falar a verdade, fora os cachorros que por ali estavam, não vi nenhum outro bicho, que não o homem.

Sim, essa religião tem seus rituais, assim como a Católica, a Evangélica, o Espiritismo, o Budismo e tantas outras. E sabe o que mais me surpreendeu? Minha surpresa foi saber que a Umbanda também é católica e espirita, ao mesmo tempo. Os orixás que são cultuados, nada mais são que forças da natureza, que na escala da divindade, está abaixo do “Todo Poderoso”. Com doutrinas diferentes, porém bem semelhantes nas suas crenças.

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Foto: Pedro Carvalho Diniz

O conhecimento, a curiosidade, o respeito e se despir de todo preconceito é o maior poder que qualquer pessoa pode ter. No final das contas, independentemente de crença, cor, partido político e time de futebol, somos todos iguais. Não há motivo para incitar o ódio e o preconceito. Só podemos e devemos criticar o que de fato conhecemos. E é assim, enfeitiçada pelos ritos de Iemanjá que me despeço, peço proteção e a saúdo, até logo, Salve Odoyá, a rainha do mar!

Texto: Giomara Damasceno, Jornalista – Blog Waldiney Passos

Fotos: Pedro Carvalho Diniz