Todos perdem com a Pandemia? Artigo do professor Moisés Almeida

(Foto: Arquivo)

Por Moisés Almeida – Professor da UPE/Petrolina, Facape e Doutorando em História do Brasil pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

TODOS PERDEM COM A PANDEMIA?

Tenho escutado frequentemente essa frase: “Todos estão perdendo com a pandemia”. Essa narrativa tem sido rotineira, numa tentativa de nivelar toda a sociedade. O discurso de que ricos e pobres estão na mesma situação se propaga e consegue adeptos em todo o planeta.

Na crise, seja ela em função de uma doença, de catástrofes ecológicas e até mesmo em situação de guerra, existem três tipos de categorias sociais: as que ganham, as que nem ganham e nem perdem e as que perdem. Então, não há como nivelar no mesmo patamar a sociedade, até porque a desigualdade existe e ela vem sendo cada vez mais escancarada com as sucessivas crises econômicas.

A minoria rica e super-rica, quando tem a necessidade de um leito de UTI equipado com a mais alta tecnologia para enfrentar a gravidade da doença, não fica em fila de espera ou faz parte do protocolo de escolha de quem deve ou não ocupar o leito. Aliás, para a maioria, que só perde com essa crise pandêmica, a única opção é: FIQUE EM CASA, que é o mesmo que dizer MORRA EM CASA.

Não é custoso afirmar que dois tipos de categorias sociais não são afetados economicamente com a crise. Existem aqueles que são beneficiados, tendo como resultado o aumento da sua riqueza em pleno colapso. Vejamos o caso de Eric Yuan, fundador da empresa de videoconferência Zoom, que entrou na lista dos bilionários da revista Forbes. O negócio dele que valia cerca de 29 bilhões de dólares antes da pandemia, atualmente está valendo 44 bilhões, quase duplicando a sua fortuna.

Essa situação me fez recordar o aumento das riquezas de milionários e bilionários em plena crise de 2016 e 2017 no Brasil e em outros países. Segundo relatório da consultoria Capgemini que acompanha a riqueza mundial, em nosso país quando a quantidade de desempregados chegava a 14 milhões de pessoas, nós víamos o Brasil ganhar 7 mil novos milionários, com fortuna superior a US$ 1 milhão.

Para a Fundação Getúlio Vargas, no primeiro trimestre de 2018, os 20% mais pobres tiveram queda real de 5% na renda média mensal, enquanto os 20% mais ricos aumentaram a sua renda em 10,8%. Sergio Miguel Buarque, em reportagem escrita para o site Marco Zero descreveu essa situação: “O relatório da Oxfam traz informações mostrando que o nível de desigualdade no Brasil é intolerável.

Por aqui, ‘cinco bilionários têm patrimônio equivalente ao da metade mais pobre do país, chegando a R$ 549 bilhões em 2017 – um número 13% maior em relação ao ano anterior. Ao mesmo tempo, os 50% mais pobres do Brasil tiveram sua riqueza reduzida no mesmo período, de 2,7% para 2%’, denuncia o documento. Dessa forma, um brasileiro que ganha um salário mínimo precisaria trabalhar 19 anos para ganhar o mesmo que recebe, em um mês, uma pessoa enquadrada entre o 0,1% mais rico”.

Segundo a Oxfam, instituição citada na reportagem mencionada acima, a concentração de riqueza se acentuou a tal ponto que em 2018, 26 bilionários tinham a mesma riqueza do que 3,8 bilhões de pessoas mais pobres do planeta. Só para lembrar: em 2017 eram 43 bilionários.

Em plena crise de 2017, a riqueza desse pessoal aumentou em 900 bilhões de dólares, enquanto a renda da metade mais pobre da população diminuiu em 11%. Aqui no Brasil, em 2017 tínhamos 2,5 milhões de pessoas vivendo com uma renda mensal de 47 reais. Repetindo: 47 reais por mês.

Então, por favor, não caiam no conto que todos perdem com a pandemia. Alguns ganham e ganham muito. A população mais pobre da humanidade paga um preço muito caro por essa desigualdade social. É essa população que vê seus entes queridos indo embora, morrendo a míngua, por falta de humanidade.

A narrativa do nivelamento de que todos perdem só corrobora com os índices de desigualdades sociais, que há décadas vêm aumentando. Os dados colocados neste texto comprovam esse disparate. A pandemia vai cada vez mais escancarar esses dados e mostrar quão cruel é esse desnível social.

As ajudas humanitárias e a solidariedade não vão resolver o problema da desigualdade. Vai chegar a hora que o cadarço do sapato também vai apertar para aquele grupo que nem ganha e nem perde. Será a vez do “salvem-se quem puder”.

O que vai acontecer depois da crise que estamos vivendo? O tempo é o senhor da razão!

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