“A escola deveria ser um local seguro”, desabafa educadora após briga envolvendo aluna de escola estadual no Rio Corrente

https://youtu.be/D-aWkaT8dTQ

Uma educadora da Escola Estadual Professor Simão Amorim Durando, localizada o bairro Rio Corrente, Zona Oeste de Petrolina (PE), fez um desabafo sobre as dificuldades dos profissionais da área de educação após precisar separar uma briga envolvendo aluna de escola na noite dessa segunda-feira (26).

No texto, Simone Mara da Silva, que trabalha como educadora de apoio, afirma que “a escola deveria ser um local seguro, um local de formação de cidadão” e questiona “como podemos formar cidadãos se as crianças, os jovens, os adolescentes que chegam à escola desconhecem os preceitos de cidadania?”.

Além disso, a profissional relata o cenário de horror que se instalou em frente à escola no turno da noite, por volta das 21h45, quando um grupo de “indivíduos de caráter duvidoso” se amontoavam na prota do colégio e uma jovem, que não era aluna da unidade, aguardava uma das estudantes para iniciar uma briga.

“Quando uma das professoras se dirigia ao ponto de ônibus, retornou porque não conseguiu sair da escola tamanha era a multidão de pessoas que aguardava a briga. Imediatamente, ela voltou e nos chamou avisando que tinha algo estranho acontecendo na frente da escola. Foi quando nos dirigimos até lá para verificar e foi ai que nos deparamos com cenas horríveis de violência. As duas meninas engalfinhadas, os indivíduos dando chutes (eles chamam de voadora) e eu e mais outro professor no meio dessa confusão tentando evitar algo mais grave”, afirmou.

“A minha colega, que é gestora adjunta mais a professora que voltou para nos chamar, tentando fechar o portão enquanto nós arrastávamos as duas para dentro da escola. Quando conseguimos colocá-las para dentro e as minhas colegas fecharam o portão, os indivíduos iniciaram uma guerra dando chutes no portão até derrubá-lo”, relatou.

O estresse mental, físico e emocional tiraram o sono da educadora e a fez chorar muito durante a noite em sua residência. “Chorei porque não foi pra isso que me preparei. Chorei porque nós somos responsabilizados por mudar uma sociedade e nós não sabemos fazer milagres. Chorei porque convidamos as famílias para nos ajudar e pais e mães não comparecem a escola, pais e mães deixam lá os seus filhos e não querem ser “incomodados” quando os chamamos para conversar sobre eles. Não participam das reuniões, dos encontros na escola porque “nunca tem tempo”.

No final do desabafo, Simone pede respeito em nome dos colegas de profissão que estiveram com ela durante o momento de terror e em nome dos tantos colegas que, diariamente, sofrem com esse tipo de situação inaceitável. “Respeito, respeito e respeito”, pediu.

Confira o relato na íntegra

Fico me perguntando o que será do futuro do Brasil? Todos os dias me faço essa pergunta. Não vejo esperança para um país mergulhado em problemas. Sou uma servidora pública, que ao contrário do que a maioria das pessoas acha, cumpro e realizo meu trabalho com amor, dedicação e compromisso. Cumpro meus horários e até trabalho horas a mais do que deveria. Não só eu. Muitos dos meus colegas também. Trabalho numa escola estadual localizada na zona oeste de Petrolina, no bairro Rio Corrente.

Às vezes não sinto que estou dentro de uma instituição educacional, porque temos que desempenhar inúmeros papeis que fogem ao papel de educador. A escola deveria ser um local seguro, um local de formação de cidadão. Mas, como podemos formar cidadãos se as crianças, os jovens, os adolescentes que chegam à escola desconhecem os preceitos de cidadania e, quando são apresentados a eles, zombam, consideram sem importância porque são crianças, jovens e adolescentes sem limites. Por isso a minha inquietação quanto ao “futuro do país”.

Coloca-se para a escola, para a educação, para os professores toda a responsabilidade de “acabar com a prática de bullying e ciberbullying”, ensinar como a “cultura de paz” é necessária para uma sociedade sem violência, a resolução de conflitos, os valores, etc, etc, etc. Eu me pergunto: como faremos isso se dentro de seus lares, esses meninos e meninas vivenciam a prática de bullying constante, se a violência dentro de casa é corriqueira, se a falta de limites e de obrigações é prática cotidiana? Se não há resolução de conflitos, se não existem valores a serem respeitados? Como a escola pode ser responsável por acabar com algo que toda a sociedade e governos não conseguiram acabar?

Ontem, dia 26 de março de 2018, segunda-feira, às 21h45, antes dos estudantes do turno noturno serem liberados, nós que trabalhamos nessa escola e os alunos que estudam nesse horário, vivenciamos uma cena típica de um filme de gangues dos anos 80. A frente da escola estava tomada de indivíduos de caráter duvidoso. Uma “garota” que não é estudante na instituição aguardava uma de nossas estudantes na rua para iniciar uma briga. Nós, que estávamos cumprindo o nosso dever dentro do estabelecimento estávamos alheios ao que estava acontecendo. Quando uma das professoras se dirigia ao ponto de ônibus, retornou porque não conseguiu sair da escola tamanha era a multidão de pessoas que aguardava a briga.

Imediatamente, ela voltou e nos chamou avisando que tinha algo estranho acontecendo na frente da escola. Foi quando nos dirigimos até lá para verificar e foi ai que nos deparamos com cenas horríveis de violência. As duas meninas engalfinhadas, os indivíduos dando chutes (eles chamam de voadora) e eu e mais outro professor no meio dessa confusão tentando evitar algo mais grave. A minha colega, que é gestora adjunta mais a professora que voltou para nos chamar, tentando fechar o portão enquanto nós arrastávamos as duas para dentro da escola.

Quando conseguimos colocá-las para dentro e as minhas colegas fecharam o portão, os indivíduos iniciaram uma guerra dando chutes no portão até derrubá-lo. Sim, derrubaram o portão de entrada da escola e as minhas colegas não foram esmagadas porque conseguiram ir segurando o portão até ele cair. Enquanto isso, os indivíduos lá fora gritavam e faziam algazarras nos vendo assustados com toda aquela violência cometida por eles.

Passamos, mais ou menos, uns 20 minutos para separar as duas garotas que estavam engalfinhadas e não se largavam. Quando conseguimos fazer isso, estávamos esbaforidos de cansaço. Eu tremia tamanha a força que tive que fazer para separá-las. Meu colega, que tinha tirado um dente no mesmo dia e que não deveria estar fazendo tanto esforço, também estava cansado.

Eu pergunto: é essa mesma a nossa função? é esse mesmo o trabalho que devemos desenvolver na escola? o nosso trabalho não merece ser considerado como um trabalho perigoso? Sabe como eu cheguei em casa? Nervosa, tremendo, perdi o sono e a fome e as minhas duas filhas que estavam em casa me esperando tiveram que me ouvir desabafar. E quando botei a cabeça no travesseiro pra passar a noite, porque não consegui dormir, chorei sem que elas vissem. Chorei porque não foi pra isso que me preparei. Chorei porque nós somos responsabilizados por mudar uma sociedade e nós não sabemos fazer milagres. Chorei porque convidamos as famílias para nos ajudar e pais e mães não comparecem a escola, pais e mães deixam lá os seus filhos e não querem ser “incomodados” quando os chamamos para conversar sobre eles. Não participam das reuniões, dos encontros na escola porque “nunca tem tempo”.

Enquanto isso, o estado nos enche com obrigações que não deveriam ser só nossas, repassa pra nós o que ele deveria fazer. Investe nada em estrutura física de escola, em recursos humanos e materiais; investe nada em profissionais de áreas que poderiam nos auxiliar, investe nada na carreira e saúde do profissional de educação.

Você sabe por que professores se aposentam com 25 anos de trabalho? Acho que está acima a explicação. Mas vou reforçar: Por que nós adoecemos e morremos aos 40, 42, 45 anos de idade por conta do estresse de um trabalho que consome a nossa saúde física, mental e emocional.

E você sabe o que vai acontecer depois desse episódio ocorrido na noite de ontem? Nada. Ou melhor, vai acontecer alguma coisa sim. Ainda aparecerão pessoas pra nos culpabilizar, tenho certeza disso.

Em meu nome e em nome dos meus colegas de profissão que estiveram comigo ontem passando por esse momento de terror, em nome dos tantos colegas que, diariamente sofrem com esse tipo de situação inaceitável, só queria pedir RESPEITO, RESPEITO E RESPEITO.

Simone Mara da Silva
Educadora de Apoio na Escola Professor Simão Amorim Durando
Petrolina-PE

2 Comentários

  • Aparecida

    27 de março de 2018 at 19:07

    Chega a ser medonho essa situação Waldiney. Com certeza nada será feito. O pior é que a educadora que relata essas cenas de terror é minha irmã. Imagina como está nossa família. Mais nós temos a melhor proteção que alguém pode ter”Deus “.

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  • Paula

    28 de março de 2018 at 08:10

    Infelizmente não é só aí.Trabalho com crianças de 4 anos.Tudo bem que estão em fase de desenvolvimento mas ás vezes já lutam assim e os responsáveis acham que somos nós que devemos educar mas nem podemos dar bronca.É confuso e para crianças também.

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